A Coroação de Carlos III: o acontecimento para uma geração

70 anos depois o Reino Unido e o mundo irão assistir à mais antiga representação de afirmação e legitimação do poder. A coroação de Carlos III, que terá como epicentro a Abadia de Westminster, em Londres, será, para muitos, o acontecimento do século, onde a pompa e toda a cenografia envolvida nos fará viajar pela história e pela cultura britânicas.

Por estes dias, os amantes da tradição, do protocolo e do cerimonial, os investigadores em simbologia e semiótica, mas também os especialistas em cinema e televisão, vivem uma roda vida de emoções. Foi preciso esperar 70 longos, mas prolíficos, anos, para se voltar a assistir ao acontecimento de uma geração em busca de fascínio e exaltação. Na história, a coroação do monarca britânico representa o garante da imortalização de um passado glorioso, um ritual com mais de mil anos, recuando até ao período anglo-saxónico, ajudando a projetar reis e rainhas como Santo Eduardo “O Confessor” (mentor da construção da Abadia de Westminster), Guilherme o Conquistador, Isabel I, Jorge III, a rainha Vitória ou Jorge VI (um dos heróis da II Guerra Mundial), sem olvidar o papel notável de Isabel II, a última soberana.

Se é verdade que, ao longo dos séculos, a afinidade dos súbditos com a Coroa nem sempre foi das melhores, certo é que a ligação que tanto Jorge VI e a sua filha Isabel II criaram com o povo britânico, geraram enormes percentagens de aceitação, mas sobretudo de gratidão, como se pôde constatar em setembro de 2022, quando  milhões de súbditos, tanto das possessões de “Sua Majestade”, como dos muitos países do antigo império, agora unidos numa “Commonwealth of Nations” e gente de toda a parte, se mantiveram hirtes e firmes, enfrentando horas e horas de espera, numa fila interminável, com a esperança de oferecer um último tributo à soberana que mais tempo reinou na ilha banhada pelo Marte do Norte e o Canal da Mancha (a que os britânicos chamam o seu “English Channel”).

Será uma manifestação visual tremenda de sentido histórico, num momento particularmente difícil para a Grã-Bretanha, a braços com uma crise que poderá levar a uma desagregação de uma união firmada no séc. XVI, com a anexação de Gales pela Inglaterra e que teve continuidade com os Atos de 1707, quando Inglaterra e Escócia se uniram para formar a Grã-Bretanha e ainda um último episódio: o Ato da União de 1800, que se caracterizou pela agregação da Irlanda no novo Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda.

A coroação busca transmitir uma relação profunda com a história de um povo, os seus líderes e as instituições que representam, com as joias da Coroa a afirmarem-se como símbolos imutáveis de autoridade, outrora divina, atualmente alvo de escrutínio, muitas vezes “demoníaco”, da opinião pública.

As Jóias da Coroa: Royal National Trust

Serão muitos os símbolos de natureza quase intemporal que estarão presentes na dignificação do ato da coroação de Carlos III. A “regalia”, termo latino que define a prerrogativa do direito real aos olhos de um Estado, caracteriza-se por um conjunto de insígnias, símbolos ou apetrechos indicativos de estatuto real, bem como direitos, prerrogativas e privilégios do soberano, ao mesmo tempo que o ato da coroação terá tanto de religioso como de dignificação do poder. No contexto da monarquia do Reino Unido essa realidade é levada a um nível impressionante tanto de cenografia, onde nada é deixado ao acaso para causar impacto visual, mas também de natureza emocional.

No centro da antiga cerimónia (que não será tão longa como dos seus antecessores nem terá tantos convidados – a coroação de Isabel II, que durou cinco horas e contou com um impressionante número de oito mil convidados presentes na Abadia de Westminster – de forma que o ato se ajuste à realidade dos tempos modernos) está um conjunto de artefactos sagrados conhecidos coletivamente como insígnias da coroação. Ao longo da solenidade, o novo monarca ostentará não uma, mas duas coroas: a Coroa de Santo Eduardo e a Imperial State Crown. A primeira, uma peça central em toda a harmonia do ato, será usada apenas no auge da cerimónia, quando será colocado na cabeça do rei Carlos III, no “momento da coroação” e que depois será colocada junto do túmulo de Santo Eduardo o Confessor, em forma de comprometimento do rei com a história dos seus antecessores no trono. A segunda coroa a ostentar na coroação é considerada uma “coroa de trabalho”, isto é, de comprometimento do monarca com a chefia do Estado. Enquanto que a coroa de Santo Eduardo é usada apenas na cerimónia de coroação, a “Imperial State Crown” é normalmente utilizada em ocasiões formais do Estado, incluindo a abertura anual do Parlamento (a State Opening of Parliament). É com esta última que Carlos III se fará mostrar aos súbditos na procissão final da Abadia de Westminster até ao Palácio de Buckingham, a bordo do “Gold State Coach”, para mais tarde surgir à varanda (o “balcony) do palácio, juntamente com “quase” toda a Família Real.

À Esquerda: Saint Edward’s Crown; à direita: Imperial State Crown

Mas não é só de coroas que é composta a regalia da coroação. Para além de uma série de mantos rituais, será possível vislumbrar o “Orbe do Soberano”. Representando o poder universal do monarca será colocado na mão direita do monarca na primeira parte da cerimónia, antes de ser transferida para o altar da abadia para o momento da coroação. O orbe tem um significado de forte simbologia religiosa, ao representar o mundo cristão, dividido em três partes, representando os três continentes conhecidos nos tempos medievais e encimado por uma cruz.

Em cima: o Orbe do Soberano e a Colher da Unção; em baixo: os ceptros da Coroação. Royal National Trust

Da cerimónia fazem parte também dois ceptros: o Ceptro do Soberano com Cruz (Sovereign’s Scepter with Cross), que, na sua extremidade, ostenta um dos mais valiosos diamantes do mundo, o Cullinnan I, encontrado na África do Sul, em 1905. Este ceptro representa o poder temporal do monarca e o seu comprometimento em servir a nação; o segundo, o Ceptro do Soberano com Pomba (Sovereign’s Scepter with Dove”) na extremidade, representa a sua união espiritual como a Igreja Anglicana (da qual é “Governador Supremo”).

Mas de todos os objetos nenhum tem maior simbolismo que a “Colher da Unção”, por duas razões: a unção do rei é o ato mais sagrado da coroação, e o mais privado, já que nem os convidados presentes na abadia nem as televisões poderão assistir a esse momento de enorme profundidade em que o peito de Carlos III será ungido com óleos sagrados (uma mistura de óleos e balsamos, cuja receita data do séc. XVI), ao som da magistral composição de Georg Friedrich Händel, “Zadock the Priest”; a segunda razão que alude à importância transcendental da “Colher da Unção” é de que é o objeto mais antigo, datando do séc. XII, já que os restantes símbolos (coroas e ceptros) datam apenas do séc. XVII. A regalia anterior foi destruída no período de vigência de Oliver Cromwell, na única experiência republicana vivida na Grã-Bretanha e que levou à execução de Carlos I. A Colher da Unção apenas “sobreviveu” porque foi vendida a um colecionador que prontamente ofereceu a Carlos II (que teve como sua esposa a rainha Catarina de Bragança) quando este assumiu o trono, em 1661, devolvendo a monarquia ao Reino Unido.

Refira-se que também a rainha-consorte, Camila, terá direito à sua “regalia”, desta feita a Queen Mary’s Crown, criada exclusivamente para a bisavó de Carlos III aquando da coroação do seu marido, o rei Jorge V, em 1911. 

Por fim, uma nota para a música que ecoará pelas naves da abadia. Serão peças de enorme profundidade religiosa, mas também de orgulho nacional como “I vow to Thee My Country” composta por Gustav Holst e Cecil Spring, “Crown Imperial” e “Pomp and Circumstance” de Edward Elgar, várias peças barrocas de Purcell e Händel, culminando com o hino “God Save the King”, que se presume ter sido composto por John Bull em 1619.

Artigo também publicado na revista Draft World Magazine a 7 de maio de 2023

As eleições brasileiras em Portugal pela visão de um eleitor português

Prestes a entrar na fila para votar, um cidadão brasileiro exibe uma bandeira e chapéu do seu país .

Esta manhã (dois de outubro de de 2022) fila interminável junto ao Instituto Superior de Engenharia do Porto, onde se encontram as urnas de voto para os cidadãos do ”país-irmão” votarem para as eleições presidenciais. Num clima de apreensão visível face ao futuro, em conversa com alguns amigos (de S. Paulo, Curitiba, Goiás, Rio de Janeiro, Ponte Preta, Recife e Santos), que se preparavam para escolher o seu candidato, foram unânimes numa expressão peculiar: “vamos tentar votar naquele que, pensamos, causará menores danos ao país”.

Não deixa de ser um paradigma digno de estudo, o contexto das profundas diferenças entre a postura demonstrada pelos eleitores brasileiros, em comparação com os portugueses. À medida que me acercava de amigos que se encontravam na extensa fila que, esta manhã, se amontoava junto ao ISEP, ouvia sons de rádio com cânticos como “está na hora do Jair ir embora”, ou “o Brasil tá na m* por causa desses políticos da p**), homens e mulheres com “camisetas” de apoio tanto a Bolsonaro como a Lula, numa atmosfera, que mais se assemelhava mais a um carnaval, do que a um período de reflexão (mais identificativo com a realidade portuguesa), apesar de se sentir uma tensão no ar face ao dia seguinte às eleições.

Segundo as últimas estatísticas, vivem em Portugal, atualmente, cerca de 250 mil brasileiros (a maior comunidade estrangeira a viver em Portugal, seguida por Cabo Verde), cerca de 81 mil encontram-se aptos a votar. Lisboa é a maior embaixada com eleitores fora do Brasil e também a cidade que concentra o maior número de cidadãos brasileiros no território português.

#brasil #brasileirosemportugal #brasileirosnaeuropa #eleicoesbrasil #eleicoes2022

Isabel II: 70 Anos que Mudaram o Mundo

Foi a monarca britânica da história que mais tempo envergou a coroa e o ceptro. A rainha que, não era para o ser, viu o mundo mudar com o fim do império e o surgimento do bipolarismo político e militar. Unânime no seu serviço à nação, viu a sua família ser devassada pelos problemas reais de um cidadão comum. Falece aos 96 anos, deixando órfã a “Commonwealth” que ajudou a preservar.

A seis de fevereiro de 1952 o Reino Unido conheceu de forma precoce o fim do reinado de Jorge VI, um dos monarcas mais amados pelos britânicos, pela capacidade demonstrada em unir a nação no seu período mais negro, marcado pela II Guerra Mundial. Junto com a sua esposa, Elizabeth Bows-Lyon (que um dia Hitler apelidou de “a mulher mais perigosa da Europa”) e com Winston Churchill, soube elevar a moral de um povo que conheceu os horrores das bombas alemãs a cair sobre as suas casas. Por essa razão, o povo despediu-se de “Bertie” (como era conhecido nos círculos restritos da família) com especial comoção, ao mesmo tempo que, com apreensão, questionavam o futuro, desta feita sob os auspícios de uma segunda era isabelina: a era de Isabel II.

Quando no início do século XX o falecimento da rainha Vitória marcou o apogeu do império britânico, poucos acreditavam que, três gerações depois, ascenderia ao trono de Santo Eduardo “o Confessor” uma mulher igualmente excepcional que suplantaria a “Viúva de Windsor” no recorde de anos ao serviço da nação (63, desde 1837 a 1901) e com tanta história em comum.

Tal como a sua trisavó, Isabel não era a herdeira direta do trono. Vitória era sobrinha de Guilherme IV que não deixou herdeiros legítimos, Isabel era sobrinha de Eduardo VIII que abdicou a favor do seu irmão, Alberto, que se tornaria Jorge VI. Isabel casaria com Filipe Mountbatten que, tal como Alberto de Saxe-Coburgo-Gota, partilhavam origens e títulos germânicos e protagonizaram exemplares histórias de amor: Vitória esteve casada 21 anos com Alberto e a sua relação foi de tal forma profunda que, após o falecimento do seu príncipe-consorte, votou-se a um auto isolamento que durou mais de seis anos. Isabel conheceu com Filipe um matrimónio que durou 74 anos e nunca ninguém duvidou dos laços que os uniam e que lhe permitiu enfrentar as contrariedades dos cargos “de primeiros funcionários públicos” do Reino Unido, dos escândalos pouco reais mas realistas que assolaram a família e ainda atentados terroristas, como o que vitimou o tio de Filipe, o conde Luís Mountbatten, em 1979.

Mas a partir daqui, começam as diferenças notórias entre os reinados da trisavó e da trineta, com destaque para o apogeu e fim do domínio britânico no mundo. Enquanto que Vitória se viu coroada como imperatriz da Índia, em 1876 (34 anos depois da sua ascensão a rainha do Reino Unido) dando início a um império “onde o sol nunca se punha” e que se estendia por quase 24 por cento da superfície terrestre, ao mesmo tempo que era dona e senhora dos mares por força da sua Marinha Real, Isabel II herdou um império moribundo, ferido de morte pelo bipolarismo surgido do desfecho da II Guerra Mundial, com os Estados Unidos da América e a União Soviética a dividirem entre si a influência política e económica que um dia pertenceu ao reino de Sua Majestade.

Contudo, se a importância britânica no mundo é a nota dominante no que concerne à diferença entre os reinados das duas monarcas, muito mais há a acrescentar. 

O mundo está muito mais rápido agora. Se no tempo da Rainha Vitória eram precisos realmente 80 dias para dar a volta ao mundo, no tempo de Isabel, mais concretamente em 1995, foi batido o recorde da volta mais rápida ao mundo: 31 horas e 27 minutos.

A notícia mais rápida a circular pelo mundo demorou, em 1997, apenas 24 segundos, com as principais capitais económicas a tremerem, em menos de um minuto, com o “crash” da bolsa de Hong Kong. Já o assassinato do presidente Abraham Lincoln, em 1865, demorou duas semanas até que o mundo soubesse pelos jornais a notícia do acontecimento.

No tempo da rainha Vitória, pouco do que acontecia dentro dos portões do palácio de Buckingham “transpirava” para a opinião pública. A 2 de junho de 1953 uma audiência de 27 milhões de pessoas assistiu em direto à coroação da filha de Jorge VI e não há um dia que passe sem que um membro da família real apareça na capa colorida de uma qualquer revista cor-de-rosa.

Certo é que o reinado de Isabel II é marcado também pelo mais longo período de paz na história do Velho Continente, ao passo que Vitória assistiu a conflitos sucessivos entre muitos dos seus filhos e netos, com a “Avó da Europa” a adivinhar o desfecho que culminaria com a I Guerra Mundial e o fim dos reinados de muitos dos seus descendentes.

As Origens Históricas do Conflito entre a China e Taiwan

Foto USNews.com

Texto publicado originalmente na revista Draft World Magazine em https://www.draft-worldmagazine.com/post/as-origens-historicas-do-conflito-entre-a-china-e-taiwan

A visita da presidente do Congresso dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, veio agudizar as relações entre dois territórios unidos por laços históricos e culturais, conhecendo a primeira rutura em 1912 e que desde então experienciou altos e baixos no diálogo diplomático entre as “duas Chinas”.

A ilha de Taiwan, oficialmente conhecida como República da China, é uma ilha separada da China pelo Estreito de Taiwan.

Achada, em 1542, pelos portugueses que a batizaram como Ilha Formosa, os seus primeiros assentamentos populacionais datam de há mais de 20 mil anos. Ancestrais dos povos indígenas estabeleceram-se na ilha há cerca de seis mil anos. Mas é apenas no século XVII que as relações com o “Império do Meio” conhecem a sua primeira página, com a imigração chinesa em larga escala para o oeste de Taiwan, numa altura em que a ilha era controlada pelos holandeses e continuou quando, em 1661, surgiu no sudoeste do território, o Reino de Tungning.

A ilha foi anexada em 1683 pela dinastia Qing e cedida ao Japão em 1895. A República da China, que derrubou os Qing em 1911 (depondo Pu Yi, o último imperador), assumiu o controlo de Taiwan em nome dos aliados, na Segunda Guerra Mundial, após a rendição nipónica, pouco tempo depois do bombardeamento atómico à cidade de Hiroshima, ocorrido a seis de agosto de 1945.

Entre 1927 e 1937 (interrompida pela invasão japonesa), o país mergulhou numa guerra civil, impulsionada pelos movimentos comunistas contra o governo, naquela época controlado pelo Partido Nacional do Povo, o Kuomintang, partido nacionalista que teve como membro mais proeminente o general Chiang Kai-Shek. Conheceu novo conflito interno a partir de 1946 na derrota do Kuomintang para as forças do Partido Comunista, liderado por Mao Tse-Tung e consequente fuga do então presidente Chiang Kai-Shek e do restante governo para Taiwan, em 1949. Taipé tornar-se-ia a capital da República da China, enquanto, em Pequim, era proclamada a República Popular da China.

Chiang Kai-Shek manteve-se no poder até 1971. A partir desse ano, o regime político haveria de evoluir para um sistema democrático, sobretudo no período de vigência de Lee Teng-Hui (ainda hoje reconhecido como o “pai da democracia de Taiwan”), com a indústria da ilha a evoluir rapidamente, até se tornar um dos territórios mais desenvolvidos da Ásia, atualmente habitado por cerca de 25 milhões de pessoas, cotando-se como a 13ª maior economia do mundo e o 17º maior exportador (dados de 2020).

Contudo, por essa altura, já as Nações Unidas e grande parte das principais potências deixaram de reconhecer Taiwan como a legítima interlocutora da China no concerto das nações e, em 1978, o presidente norte-americano Jimmy Carter anuncia que a representação diplomática dos Estados Unidos passaria para o continente, numa clara alusão à soberania da República Popular como representante oficial da China no contexto internacional.

As relações sino-taiwanesas conheceram um período de relativa paz a partir de 1980, quando Pequim e Taipei alcançam um acordo que permitiria a entrada conjunta de cidadãos e de empresas numa flexibilização das regras alfandegárias e de investimentos. Em 1991 Lee Teng-Hui assumiria formalmente o fim do conflito com a República Popular da China.

Tal declaração não terminou com a intenção de Pequim em anexar a ilha. A China propôs a chamada opção “um país, dois sistemas”, que, segundo o poder comunista, daria a Taiwan uma autonomia significativa se concordasse em ficar sob o controlo do Congresso Nacional do Povo, à semelhança de Macau e de Hong-Kong. A proposta foi recusada liminarmente, sobretudo a partir do momento em que sobe ao poder, no ano 2000, o presidente Chen Shui-Bian, político avesso às pretensões chinesas, provocando o alarme do Comité Central. O conflito ganharia mais contornos a partir de 2004, ano em que Pequim aprovou a chamada “lei anti-secessão”, afirmando o direito de Pequim em usar “meios não pacíficos” contra Taiwan se esta tentasse “separar-se” da China, uma retórica que se intensificou também no plano económico quando, em 2018, Xi Jinping intensificou a pressão sobre as empresas internacionais: se estas não listassem Taiwan como parte da China nos seus sítios na internet, estas poderiam ser proibidas de realizar negócios com o gigante asiático.

E é nesta equação conturbada que os Estados Unidos, influenciados pelos seus próprios interesses estratégicos e económicos, vê a balança pender, ora para o lado de Taipei, ora para Pequim. Se numa primeira fase Washington se viu obrigado a aceitar o regime comunista como legítimo defensor dos interesses do povo chinês na senda diplomática internacional, o mesmo apoio tem oscilado, à medida que Taiwan se afirma como um aliado privilegiado no extremo asiático, ao ponto de fornecer armas ao exército taiwanês para fazer face a uma possível invasão.

Em maio de 2022, o presidente Joe Biden, quando questionado se os EUA defenderiam Taiwan militarmente em caso de uma incursão chinesa, respondeu afirmativamente, declarações que seriam alteradas, “à posteriori”, pelos serviços diplomáticos da Casa Branca, esclarecendo que a posição americana sobre Taiwan não havia mudado, reiterando o compromisso com a política de “Uma China”. Pouco tempo depois a administração Biden cairia novamente em contradição ao declarar total apoio militar a Taiwan.

Pequim condenou imediatamente o apoio público de Washington a Taipei, intensificando a sua presença militar tanto nas águas do Estreito de Taiwan como nos céus da ilha e que agora viu novamente reforçado no momento em que a “speaker” do congresso americano aterrou na Formosa.

Dia da Europa comemorado em tempos de incerteza

A nove de maio cumprem-se 72 anos desde que foi proferida a “Declaração Schuman”, evento que a grande maioria dos países do “Velho Continente” acredita ser o episódio fundamental para o nascimento da atual União Europeia (EU). Mais de meio século depois, os mesmos desafios que levaram à criação da EU inquietam os dias que vivemos.

Uma Europa dilacerada por dois conflitos de proporções que ainda hoje não conseguimos quantificar, a contas com um novo conflito – que mais tarde Winston Churchill haveria de identificá-la como a “Guerra Fria” – clamava por um período de paz que há muito não vivia.

Essa necessidade de paz duradoura foi o mote para os países do centro da Europa (os mais fustigados pelas contendas da primeira metade do séc. XX) se unirem em torno de um projeto comum europeu, congregando, inicialmente, esforços a nível económico, mas com o horizonte numa união também social e cultural: “Assim será alcançada de forma simples e rápida a fusão de interesses essenciais para o estabelecimento de uma comunidade económica que introduz o fermento de uma comunidade mais ampla e profunda entre países há muito combatidos por divisões sangrentas”, vincou, em 1950, Robert Schuman. Esta citação é uma das passagens essenciais do discurso redigido pelo então ministro dos Negócios Estrangeiros da França e Jean Monnet e que ficou conhecida como a “Declaração Schuman”. Proferida a 9 de maio, esse acontecimento levou a que todos os anos, desde 1985, os países da União celebrem o “Dia da Europa”.

Clique aqui para ler o artigo integral na Revista Draft World Magazine.

Artur Filipe dos Santos recebe medalha pela Academia Internacional de Protocolo y Cerimnial

É com sentido de humildade e gosto pelo trabalho desenvolvido no campo da história, comunicação e promoção das boas práticas em estudos protocolários (protocolo académico, diplomático e de Estado) que recebo a notícia da medalha outorgada pela 𝐀𝐜𝐚𝐝𝐞𝐦𝐢𝐚 𝐈𝐧𝐭𝐞𝐫𝐧𝐚𝐜𝐢𝐨𝐧𝐚𝐥 𝐝𝐞 𝐏𝐫𝐨𝐭𝐨𝐜𝐨𝐥𝐨 y 𝐂𝐞𝐫𝐢𝐦𝐨𝐧𝐢𝐚𝐥 como “académico numerário”, agradecendo a esta instituição e à Sociedad de Estudios Institucionales tão honrosa distinção. #protocolo #cerimonial #comunicacao

Isabel II – 70 Anos que Mudaram o Mundo

Isabel II está no trono desde 1952

É a monarca britânica da história que há mais tempo segura a coroa e o ceptro. A rainha que, não era para o ser, viu o mundo mudar com o fim do império e o surgimento do bipolarismo político e militar. Unânime no seu serviço à nação, viu a sua família ser devassada pelos problemas reais de um cidadão comum.

A seis de fevereiro de 1952 o Reino Unido conheceu de forma precoce o fim do reinado de Jorge VI, um dos monarcas mais amados pelos britânicos, pela capacidade demonstrada em unir a nação no seu período mais negro, marcado pela II Guerra Mundial. Junto com a sua esposa, Elizabeth Bows-Lyon (que um dia Hitler apelidou de “a mulher mais perigosa da Europa”) e com Winston Churchill, soube elevar a moral de um povo que conheceu os horrores das bombas alemãs a cair sobre as suas casas. Por essa razão, o povo despediu-se de “Bertie” (como era conhecido nos círculos restritos da família) com especial comoção, ao mesmo tempo que, com apreensão, questionavam o futuro, desta feita sob os auspícios de uma segunda era isabelina: a era de Isabel II.

Leia o artigo completo na Draft World Magazine: https://www.draft-worldmagazine.com/post/isabel-ii-70-anos-que-mudaram-o-mundo

#thequeen #rainhaisabelii #jornalismo

As cores dos cursos universitários

Na última visita de estudo que realizei a Braga, uma aluna, confessando ter assistido à abertura de um ano académico em Coimbra, perguntou-me se o reitor “veste” as cores do sua faculdade quando investido da sua toga doutoral, ao que eu respondi “Não”. E passei a explicar:
Numa das imagens apresento as cores das várias faculdades tradicionais das universidades portuguesas, como por exemplo o amarelo (Medicina) ou vermelho (Direito). Contudo o magnífico reitor, seja ele catedrático de medicina, ciências, direito ou engenharia, quando é eleito para o cargo não irá utilizar cor da sua faculdade, pois estará numa posição de representação de todas as faculdades, de toda uma instituição centenária fundada por el-rei D. Dinis e fixada definitivamente em Coimbra pelo rei D. João III.
Com vista a preservar a memória histórica da Universidade de Voimbra, o reitor quando investido utiliza a cor verde, que não é utilizada por qualquer faculdade atualmente, pois é a cor do DIREITO CANÓNICO, uma das faculdades históricas desta instituição a par com Teologia, Medicina e Direito Civil. Com a laicização do Estado, o Direito Canónico desapareceu ficando a cor “de vago” tornando-se assim a cor reitoral. Por essa razão, a sala dos Capelos (sala onde foi aclamado D. João, mestre de Avis como rei de Portugal em 1385, onde são prestadas as provas de doutoramento e onde são realizadas as cerimónias oficiais como a investidura do novo reitor ou a abertura do ano académico) é “presidida” por uma cadeira de cor verde, a cadeira do Magnífico Reitor da Universidade de Coimbra.

. #usp #historia #protocolouniversitario #universidadedecoimbra #UC #protocolo #cerimonial

A Independência da Escócia Conhece Hoje muito do Seu Futuro

Reino Unido: Até quando?
Fonte: Financial Times – Bill Butcher

Texto publicado originalmente na revista online Draft World Magazine a 6 de maio de 2021, disponível em https://www.draft-worldmagazine.com/post/reino-unido-ate-quando. (Permitido a transcrição completa e parcial deste artigo com a seguinte cita Santos, Artur Filipe (2021). A Independência da Escócia Conhece Hoje Muito do seu Futuro. Disponível em https://www.draft-worldmagazine.com/post/reino-unido-ate-quando. Acedido a…)

Eleições para o Parlamento de Edimburgo

Esta quinta-feira, 6 de maio, os quase seis milhões de escoceses decidem nas urnas se mantém a confiam na atual “firts-minister” Nicola Sturgeon e o partido que representa, o SNP-Scottish National Party.

Mais do que decidir a continuidade de um governo nas mãos do SNP (no poder desde 2007), nesta “super quinta-feira”, o país de William Wallace, Rob Roy, dos kilts e das gaitas de foles, escolherá se devolve à agenda mediática as pretensões crescentes de independência, agora que o “reino de Sua Majestade” abandonou a União Europeia.

Sturgeon, que, em 2014, sucedeu a Alex Salmond que se demitiu no rescaldo da derrota do referendo à independência escocesa, sempre se mostrou pouco convencida com os resultados do plebiscito que deu a vitória ao “Maintain” por apenas cinco pontos percentuais (o “SIM” à independência conquistou 44 por cento).

Na altura, o SNP justificou o resultado acusando Westminster de pressionar os escoceses com a questão da União Europeia: caso a Escócia se tornasse independente, o Reino Unido (RU) vetaria sempre a entrada dos vizinhos do norte na União.

Os escoceses sempre se mostraram europeístas convictos, desde os tempos em que Margaret Thatcher se opunha ferozmente à entrada do RU na então CEE (Comunidade Económica Europeia). Agora que Boris Johnson empurrou a Grã-Bretanha para fora da família europeia, num processo conturbado, que ainda hoje se arrasta até ao desfecho de um acordo comercial entre Londres e Bruxelas que, muito provavelmente manterá a questão sensível da fronteira entre as Irlandas, ao que se junta os protestos dos pescadores e agricultores escoceses que viram a sua atividade prejudicada pelo “Brexit”.

E a realidade espelhada pelo referendo de 2016, que ditou, quatro anos depois, o abandono, quatro décadas desde a adesão ao “desígnio europeu”, resultou num novo fôlego às pretensões independentistas: das três nações que compõem o Reino Unido, Inglaterra, o País de Gales e Escócia e ainda o território da Irlanda do Norte, os dois países da lista afirmaram, com pouca margem, o “sim” ao Brexit, enquanto que a Escócia votou maioritariamente no “Não”, com 62 por cento dos eleitores a reiterarem o seu compromisso com o projeto europeu.

Estava dado o mote para a cisão do Reino Unido, que pode muito bem colocar em causa, num futuro próximo, a sobrevivência da Grã-Bretanha enquanto nação a uma só voz.

Muitas são as vozes que se ouvem em Glasgow, Abardeen, Edimburgo e pelas Terras Altas da Escócia que referem que apenas a mensagem unificadora e o exemplo de serviço demonstrado pela monarca Isabel II mantém, ainda que de forma ténue, o elo selado em 1707 entre a Escócia de Jaime VI e a Inglaterra do mesmo rei, que passaria para a história como Jaime I do Reino Unido (mas até quando?).

𝐀 𝐨𝐫𝐢𝐠𝐞𝐦 𝐝𝐚 𝐭𝐫𝐚𝐝𝐢çã𝐨 𝐩𝐫𝐨𝐭𝐨𝐜𝐨𝐥𝐚𝐫 𝐝𝐚 𝐛𝐚𝐧𝐝𝐞𝐢𝐫𝐚 𝐚 𝐦𝐞𝐢𝐚-𝐡𝐚𝐬𝐭𝐞

Bandeira a meia-haste no alto do Castelo de Edimburgo


No reino de Sua Majestade vivem-se tempos de luto, o país despede-se do príncipe consorte com o “reinado” mais longo da história da monarquia britânica. Um pouco por toda a Grã-Bretanha, nos edifícios públicos e dependências da Coroa e nos países que compõe a “Commonwealth of Nations”, (territórios independentes que, à excepção de Moçambique, fizeram parte do Império Britânico) assistimos, tal como em Portugal em momentos de luto nacional ou local) à disposição da bandeira nacional (a Union Jack) ou do estandarte real a meia-haste. Comum a sua utilização, não tão comum a percepção da origem desta tradição fundamental do protocolo no concerto das nações.
Não são unânimes os investigadores destas matérias quanto à origem da utilização da bandeira à meia-haste. Certo é que muitos identificam o episódio histórico da morte de James Hall, capitão do navio inglês Heart’s Ease, às mãos de um nativo inuit, ocorrida no decurso de uma expedição ao norte do Canadá, a 14 de julho de 1612. Em sinal de respeito (mas também sob o efeito alguma superstição marinheira) os seus homens baixaram o pavilhão a meia-haste. Segundo a tradição, a bandeira do navio foi colocada a meio mastro para dar lugar à invisível bandeira da Morte. Na verdade, quando o navio voltou a Londres, a bandeira da embarcação ainda estava a meio mastro, o que implica que a tripulação ainda navegava sob o signo da bandeira imaginária.
Quaisquer que sejam as origens, a tradição tornou-se mais amplamente adotada com o tempo, principalmente pelos marinheiros. Um dos primeiros relatos que temos dessa prática na história data de 1799, quando o Departamento da Marinha Americana ordenou que todos os seus navios baixassem suas bandeiras a meia-haste (Hlaf-Staff) após a morte de George Washington ou ainda o histórico episódio da colocação dos pavilhões em “half-mast” de todos os navios britânicos sobreviventes que tomaram parte da batalha de Trafalgar, no momento da morte do carismático almirante Horacio Nelson.
Na imagem a Union Jack (bandeira nacional do Reino Unido) a meia-haste no Castelo de Edimburgo. #protocolo #meiahaste #protocolodeestado #vexilologia

Neste blogue serão publicados artigos sobre política, vexilologia e protocolo, de Artur Filipe dos Santos, Doutorado em Comunicação, Publicidade Relações Públicas e Protocolo, Professor Universitário, consultor e investigador em Comunicação Institucional e Património, Protocolista, Sociólogo. Email: artursantosdocente@gmail.com